Mulheres de Cinzas, de
Mia Couto, é uma obra literária que se passa no final do século 19, no
sul de Moçambique, na África. A história se passa em meios aos conflitos
travados pelos portugueses contra o imperador local Ngungunyane, um dos
últimos líderes do Estado de Gaza, pelo controle da região. É um épico
poético-histórico que conta com dois protagonistas, o sargento Germano e
a jovem intérprete Imani, cujo romance conhecemos por meio de cartas
enviadas pelo sargento à Portugal.
Naquela época,
os portugueses, em sua maioria, ainda acreditavam que os africanos eram
desprovidos de alma, e essa teoria era usada para justificar os abusos e
barbaridades da colonização e da escravidão. Mesmo que no vilarejo de Nkokolani os abusos cometidos pelos portugueses não fossem tão explícitos, ainda assim eles se achavam superiores. A maioria deles, por exemplo, exigia que os nativos os carregassem.
Fugindo à
regra de comportamento dos portugueses, o sargento Germano andava pelas
próprias pernas e parecia se importar com o povo. Além disso, por meio
das cartas que ele enviava ao seu superior em Portugal, ele demonstrava
se sentir frágil perante às imprevisibilidades da vida. Assim,
se por um lado poderíamos ter uma visão pré-estabelecida de que ele
poderia se valer de sua “superioridade branca” ou de sua patente no
exército português para se aproveitar da jovem Imani, é interessante e
rico para o livro observar que isso não acontece.
Imani é
uma personagem complexa. Inteligente, falante da língua do colonizador e
estrategicamente silenciosa, Imani conseguiu passar despercebida por
todos, mas não por Germano. Eles se envolvem romanticamente, mas isso
não é o foco principal da obra e muito menos é marcada pela abusividade
que podemos esperar deste tipo de relação (entre homens que podem se
valer da idade, patente ou outro tipo de “superioridade” para obter
vantagens de cunho amoroso e sexual de mulheres).
Em Mulheres de Cinzas, na verdade, a personagem principal é a Guerra: enquanto
um dos irmãos de Imani se alia aos portugueses, o outro se alia ao
imperador, e assim, em meio aos conflitos locais, vamos acompanhando as
diferenças que separam os mundos de Germano e Imani e conhecendo mais
sobre as opressões sofridas pelos africanos nas mãos dos portugueses
nesse episódio da história da humanidade.
Mulheres de Cinzas
tem uma linguagem um pouco diferente de nosso “português brasileiro”,
personagens complexos e um enredo muito interessante, envolto na
fantasia e magia locais. Muito mais do que um livro sobre uma história
de amor, é um livro para pensar em diferenças, respeito, história e
opressão.
Fonte: site "Lado M"
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